O que é isso, companheiro?


Temos uma nova presidente, a primeira mulher na História do Brasil a exercer o cargo máximo do poder executivo e blá, blá, blá, wiskas sachê. Votei na Dilma no segundo turno, sim, mas admito que não sei se posso confiar nela. O que sei é que não confio de forma alguma no Serra – ou melhor, na forma de fazer política do PSDB que ele representa. Como li por aí durante a campanha, a Dilma não era a candidata dos nossos sonhos, mas definitivamente o Serra era o candidato dos nossos mais terríveis pesadelos.

A questão me parece mais ou menos simples; eu, enquanto classe média baixa, vi – e vivi – melhoras significativas durante o governo petista. Lembro-me da campanha chantagista do PSDB com a Regina Duarte, em cadeia nacional, dizendo “eu tenho medo”. Olha, depois de oito anos (e agora com mais quatro confirmados), se ela ainda não saiu do país ou tá com uma terrível síndrome do pânico, já deve ter encontrado um bom psicólogo / psiquiatra e tá tomando remédios de tarja preta pra vencer esse medo. Porque, né? O povo parece estar gostando.

O PT já não é de esquerda há algum tempo, é preciso que se diga. No máximo, no máximo, eu diria que ele é um centro-moderado. Ainda tem enfoque nas políticas assistencialistas, mas sem as neuroses de outros partidos (pelamordedeus, o que é o slogan “contra burguês, vote 16” em pleno século XXI?!); dá um certo apoio às elites, mas sem a babação da direita, muitíssimo bem representada pelo PhD Fernando Henrique Cardoso e pelo até ontem candidato José Serra. Na verdade o governo de Lula foi populista – uma espécie de neo-varguismo modernizado (amigos historiadores, não me acusem de anacronismo, estou apenas divagando) –, mas o que mais me chamou a atenção na candidatura do Lula em 2010 (vá, quem se candidatou foi o Lula, a Dilma foi só fachada) foi o apoio massivo da elite intelectual do país. Professores universitários e até reitores fazendo manifestos públicos de apoio ao governo petista. Não sou uma grande conhecedora da História política do meu país (confesso, com certa vergonha), mas isso me parece inédito. Um governo populista, por princípio, em geral desagrada às elites – todas elas, inclusive a intelectual. Dessa vez houve uma mudança. Não consigo vislumbrar muito bem onde, ou por que; talvez o futuro me responda.

De minha parte, não tenho do que reclamar do governo petista. Escândalos? Ora, o dia que me apresentarem um único governo que tenha cumprido seu mandato sem escândalos a perder de vista, eu começo a respeitar esse argumento. Até lá, pra mim sempre vai soar como o seis falando do meia dúzia. E eu não respeito esse tipo de coisa. O que eu vi, aqui da Baixada Fluminense, lugar com maioria pobre, com pai motorista aposentado e mãe dona de casa, ambos sem o ensino fundamental completo, e eu tendo que ralar MUITO pra trabalhar e fazer faculdade, foi um certo aumento de padrão de vida ao meu redor. Admito, eu amaldiçôo o inventor do automóvel quando preciso ficar duas, três horas pra fazer um percurso que, há seis anos, eu fazia às vezes em menos de uma hora. Mas, racionalmente falando, existem mais automóveis na rua, por isso tanto engarrafamento. De onde saiu o dinheiro pra tanta gente comprar carro? E eu percorro as grandes vias de acesso da periferia para o Centro do Rio (Dutra, Av. Brasil); ou seja, eu vou do menor para o maior poder aquisitivo (em teoria – não incluo aqui as favelas – ops! Comunidades, pra ser politicamente correta).

Além do mais, eu presenciei – e ainda presencio – as mudanças na UFRJ. Da era PSDB por lá, eu só ouço falar; campus abandonado à noite, grade de docentes abaixo do mínimo possível pra se trabalhar (e aqui eu falo do meu curso, Dança), com os professores tendo que se desdobrar em várias disciplinas porque não abriam concursos, greves anuais e, bolsa de pesquisa? Onde? O que é isso? Afinal, pra que um curso de artes vai precisar pesquisar, não é mesmo? Como dizem por aí, é só “dançar”.

Dos oito anos do governo petista, eu estou por lá desde 2004 – ou seja, seis anos (meu curso tem duração de cinco, e, bem, como eu disse, tive que trabalhar durante a faculdade...). O que eu vejo hoje é um campus em obra, iluminado, com segurança da universidade e PM’s montados fazendo ronda à noite. Perigoso? Olha, se me disserem um lugar da cidade do Rio que não seja perigoso à noite, eu posso até concordar. Nunca fui assaltada lá; em compensação já tive uma metralhadora apontada pra minha cabeça em plena Av. Pres. Dutra, voltando de uma festa. Conheço gente que já sofreu sequestro relâmpago no campus; mas também sei de bandido que invadiu o prédio do IFCS, em pleno Centro do Rio, à luz do dia. E aí? Além disso, não sei nos outros cursos, mas na Dança nós estamos com concursos pra docentes há algum tempo, e ainda há muitas vagas a serem preenchidas, finalmente. Temos inúmeras bolsas de pesquisa, e, com isso, a produção está crescendo a olhos vistos – o curso já está quase engolindo o de Ed. Física, com o qual divide o prédio. Prova de que, com o devido incentivo, um curso de arte pode fazer muita coisa.

Parando de olhar pro meu próprio umbigo (bom, eu tento, dentro do possível, só falar daquilo que conheço pra tentar falar o menos possível de besteiras), passamos muito bem, obrigada, por uma crise que abalou os grandes poderosos do mundo. Das duas uma; ou o brasileiro já tá TÃO acostumado com crises que nem percebeu essa, ou então realmente ela só chegou aqui como uma marolinha. O nível de desemprego no país está batendo recordes – de baixa, é importante que se diga –, e há algumas áreas, como a de construção civil, por exemplo, carecendo de mão de obra. E isso do nível de pedreiro até engenheiro. Aliás, a imagem que ilustra este post é de uma matéria de 14 páginas feita pela revista especializada em economia The Economist em novembro de 2009 sobre “o maior sucesso da história da América Latina”. Infelizmente eu não tive acesso à matéria completa, mas eu ainda a encontro. Já mencionei que pagamos a dívida externa? Bem, quem é da minha geração certamente se lembra da época em que isso parecia impossível.

É claro que nem tudo são flores. A saúde ainda anda abandonada por aqui, e o alinhamento do governo petista com ditadores como Hugo Chávez e Armadinejad não ajuda muito – mas também não é nada tão preocupante assim. Em nenhum momento Lula ou quem quer que seja do PT deu mostras de querer seguir a história de ditadura desses dois, até porque o Brasil tem péssimas memórias de seu próprio período ditatorial, e não creio que o povo, hoje, aceitasse esse tipo de coisa (eu espero, porque ainda me assusta brasileiros dizendo que “na época da ditadura as coisas eram melhores”. Isso porque eu tentei ser militar durante muito tempo, mas daí a dizer que a ditadura dava melhor condição de vida pra população... É muito discurso de mídia manipulada pelos estadunidenses). Em todo caso, o Brasil tem mantido boas relações em geral, seja com governos polêmicos, seja com os mais tradicionais, como manda a política da boa vizinhança – e, o melhor, sem a babação de ovo do governo PSDB pra cima dos EUA. Aliás, não deixa de ser engraçado ver os EUA criticando o apoio de Lula ao presidente do Irã, quando eles mesmos apoiaram o golpe de 64 aqui no Brasil, além de apoiarem um assassino no nipe de Pinochet, depois de cercarem o palácio do governo do Chile e “suicidarem” Allende. Oh, well. As ditaduras são boas desde que favoreçam o “american way life”. ENTÃO TÁ, NÉ.

(É mais forte do que eu. Falar de política sempre me leva a criticar o atual Império do Ocidente. Coisa de quem vive na colônia, acho. Como dizia meu ex-professor de conhecimentos bancários, “os americanos são ótimos. Adoro os americanos. Especialmente à milanesa”.)

Enfim, no todo, particularmente, eu não tenho do que reclamar do governo petista do Lula. Embora veja Dilma com bastante desconfiança, espero sinceramente que ela siga o mesmo caminho do seu antecessor. Funcionários de estatais, podem respirar aliviados porque vão manter seus empregos, sem privatizações; pessoal concurseiro, pode respirar aliviado e continuar seus estudos, porque vão continuar a surgir vagas. E pessoal da UFRJ (e demais federais), pode respirar aliviado porque, pelo menos pelos próximos quatro anos, a tendência é que aquela terrível fase de greves anuais não volte, e o ano letivo pode terminar na santa paz do Senhor. Ops! “Pregaram” por aí que a Dilma era uma atéia comedora de criancinhas; será que posso usar essa expressão, “santa paz do Senhor”, no caso?!

P.s.¹: O Serra deu a entender que ainda tem gás pra mais uma disputa eleitoral daqui a quatro anos. Eu realmente não sei se a Dilma vai ter o carisma do Lula pra descolar uma reeleição – ele, em compensação, se voltar ganha, mas duvido que volte; ele agora parece querer voos mais altos –, em todo caso, daqui a quatro anos qualquer que seja o candidato do PT ou do PSDB (argh!), vai ter que enfrentar um páreo muito duro; a Marina vai chegar RASGANDO. Guardem o que estou dizendo.

P.s.²: Estou curiosa pensando qual vai ser a matéria de capa da “imparcial” revista Veja. Com a vitória de Dilma, será que eles vão anunciar o Armageddon? Ou vão encenar o enterro do Brasil?