Pra encerrar...


É, esta bagaça está às moscas, como sempre acontece com todos os meus blogs. Pelo menos este tem um bom motivo: a falta de tempo e até mesmo prática. Escrita é prática, e a minha prática tem se limitado àquele tipo de escrita que obedece às normas da ABNT. E, acreditem, essa não tem poesia nenhuma e bem pouco humor.

Mas de vez em quando eu consigo dar uma fugida pra reclamar de algo, ou me deparo com algum texto que mexe fundo comigo e venho postar aqui, pra deixar registrado, pra eu lembrar depois. Tenho (sempre tive) a sensação de que há mundos paralelos, onde pessoas que nunca vi na vida escrevem exatamente aquilo que aconteceu na minha vida, ou que estou sentido. Deve ter algo a ver com o Inconsciente Coletivo de Jung. Ou não. Tô tentando procurar menos explicações pras coisas. Tentando tentar entender menos (e isso é muito difícil pra mim).

Então, pra encerrar 2011 (e não o blog - ainda não), um texto da Milena, do Samba de Gringo. Mais um. Mas esse realmente...

Dei uma editada no texto - ele é escrito com um eu lírico masculino (desculpa, moça!). O original você encontra no link acima.

Eu resolvi te deixar ir. A mágoa já passou, as feridas estão cicatrizando levemente de fora pra dentro, porque dentro ainda me doem. Não posso colocar toda a culpa de um amor impossível em você. Não posso esperar que seja tão emoção quanto eu, que tenha menos razão nesse jogo sem fim onde a razão é a única coisa que faz sentido. Você nunca quis me machucar e eu sei disso. E sei também do tanto que me amou, não precisa dizer com os lábios o que teus olhos me disseram um dia. Hoje eu consigo olhar para trás e ver o quanto você procurou o meu bem, e se um dia me fez algum mal, foi apenas por ter se envolvido mais do que podia.
Não dava mais para insistir, eu sei. Por maior que seja o amor, nem sempre é possível tocá-lo. Por isso estou aqui hoje, na beira norte do rio, curvando meu corpo sobre a ilhazinha onde a gente se escondeu por tantos dias. Revivendo de novo os cheiros e sons que me lembram o gosto da tua pele, o calor do teu beijo em mim. Me perguntando se um dia a vida cruzará nossos caminhos mais uma vez.
Fiz um barquinho de papel pra você. Ele é você. E quando eu te soltar por esse rio, quero que navegue tranquilo. Embrulhei nele todo o amor que senti por você um dia – e ainda sinto - pra que de algum jeito, quando sentir que a vida te machuca um pouco, possa lembrar-te do quanto alguém te amou um dia. Não guardo mágoa nenhuma, menino. Só te quero bem e feliz. E também quero ficar bem e feliz. Você disse que tudo isso era melhor pra todo mundo e hoje eu entendo o quanto isso foi importante para mim. Cara, como eu te amei. Como eu pensei em você por cada dia desses três anos e meio, mesmo quando nos separamos daquela outra vez.
Eu sinto tanta falta tua. Sinto falta desse monte de coisa bonita que vinha com esse “nós” improvável. Do nosso amor, da nossa história, de você me dizendo que não queria parar. E hoje, olha pra gente. Você me pedindo para desistir e eu desistindo. Você me pedindo para esquecer tudo e eu esquecendo.

Vai barquinho. Leva contigo todo esse amor absurdo e impossível que tenho por ti. Segue teu rumo, encontra o que procura. Seja feliz, muito feliz, ainda que não seja eu o motivo da tua felicidade. Tente lembrar-se de mim de vez em quando e de todas as horas lindas que dividimos. Tenta me esquecer devagar. E aprenda a seguir teu coração nesse meio tempo de vida em que estivermos separados.
Se nos veremos novamente? Não sei. Não sei ao menos se nos falaremos mais alguma vez. Mas as portas estão abertas, você sabe e sempre soube. As portas estão sempre abertas pra você. Te cuida bem, tá? Quem sabe um dia a gente senta numa mesa de bar, sem medos e sem corações, e bebe um amor impossível.
Deixei de tentar entender, estou apenas entregando meu amor por você, um barquinho, ao mundo. Que a vida cuide das nossas estradas, do nosso futuro. Que você consiga se encontrar na tua estrada e eu na minha. Que nós dois sejamos apenas amor, sem ressentimentos. Sem drama. Sem mágoa.

Vai, barquinho, vai, segue tua correnteza. Eu sigo meu caminho de volta com todo um nó na garganta e a esperança de que o tempo cura todos os corações. E se um dia nossos caminhos se cruzarem de novo, a vida se encarregará de encaixar as peças. O que tiver que voltar, volta um dia, mas não nos preocupemos com isso agora. Vai, barquinho. Apenas vá. Eu vou também. Te cuida. Te amo imensamente.

Vai, 2011, e leva com você o meu amor impossível. Venha, 2012, e me traga novas pessoas, novos amores, novos amigos, novas histórias.

Relacionamentos pós-modernos



Em primeiro lugar, gostaria de deixar claro que eu não dei procuração a ninguém pra queimar sutiã em meu nome, muito menos pra defender essa zona de comportamento entre os gêneros que se apresenta por aí. Essa bagunça a que muitos chamam de "liberdade", onde a experimentação de tudo é acessível a todos, só torna o mundo um lugar MUITO confuso. Pelo menos pra mim. Eu já sei há alguns anos - e cada vez tenho mais certeza - que homem não sabe terminar relacionamento. Mas não saber começar é novidade.

Ok, eu já fui bem feminista. Do tipo quase estereotipado. Homens e mulheres eram iguais, tinham direitos e deveres iguais e podiam fazer as mesmíssimas coisas. Eu gostava de carregar peso só pra provar que eu PODIA. Eu brigava com meus amiguinhos homens durante a adolescência pra provar que eu PODIA ser tão forte quanto eles - o que a fisiologia obviamente discordava, mas eu nunca dei o braço a torcer, mesmo saindo com ele (o braço) roxo. Mas, sabe? Cansei. Tédio total. Pra que isso? Quer carregar a bolsa pra mim porque acha que tá muito pesada? Carregue. Quer se achar mais forte que eu? Ache-se, provavelmente é mesmo, ainda que eu tenha uma força considerável, ela vai ser menor do que a da maioria dos homens. E eu durmo muito bem mesmo sabendo disso.

Mas em matéria de relacionamentos a coisa tá confusa num nível que eu não consigo alcançar. Tipo, sempre houve protocolos de conquista desde que o mundo é mundo. Até entre os animais - os outros, os chamados "irracionais" (rá) - é assim. Não questiono isso. Sou uma pessoa muito cheia de protocolos. Acho bacana, acho coerente, acho que torna as coisas mais simples e claras, cada um no seu quadrado. Mas eu não tô mais entendendo como a coisa se processa hoje em dia.

Quer dizer, antigamente os homens chegavam nas mulheres. Eles davam em cima, eles cortejavam, e cabia a nós jogar um certo charme pra chamar a atenção de quem nos interessava ou cortar os que não interessavam. Tudo era muito claro. Os machos faziam gracinhas pra chamar a atenção das fêmeas - alá os bichos dando exemplo de novo. E funciona com eles, e durante milênios funcionou com a gente. Maaas, insatisfeito como é o ser humano, alguém resolveu que não tava bom assim, e pronto. Agora é essa zona que presenciamos. As mulheres vão à caça - gostaria de ressaltar que não faço parte da Família Dinossauro e não me apraz caçar minha comida, prefiro sentar calmamente num bom restaurante e esperar ser servida.

É sério, a falta de atitude dos homens já há algum tempo tem me exasperado. Eu costumo brincar que os homens têm medo de mim - mas é só brincadeira, porque reluto em aceitar que chegamos ao ponto de um HOMEM ter medo de uma MULHER. Eu não mordo - exceto em contextos especiais -, não tenho nenhuma anomalia aparente (as questões de personalidade não contam, né?), as pessoas me acham bonita e eu tenho certo grau de inteligência. Não acredito que o fato de gostar de futebol, UFC e abominar rosa e comédias românticas me torna alguém temível - não deveria ser o contrário, já que eu tenho mais gostos em comum com os homens em geral do que as menininhas fresquinhas? Quando eu era adolescente e BATIA nos meninos, eles não tinham medo de mim! Porque os homens de hoje, nos quais NÃO bato, teriam? Não faz sentido, né? Pois é, eu também acho.

Mas os caras não têm reação. Impressionante. Eu fico pensando nos dois últimos com quem me envolvi. A iniciativa do primeiro beijo teve que ser minha, porque se dependesse deles ficaríamos uma vida olhando um pra cara do outro - isso porque o último tinha até bastante atitude, mas de vez em quando aparentemente travava na minha frente (travar é o termo, sempre travou, incrível. Quer dizer, guardados os devidos contextos, né, há situações e situações). Cara, que inferno! Mermão, acabou o assunto, ficou um olhando pro outro? Não tem o que pensar, chuta pro gol e corre pro abraço. A garota não vai meter a mão na sua cara se você beijá-la - provavelmente o faria se você cruzasse com ela na rua e a agarrasse. Bem, pelo menos eu faria, nessas circunstâncias. Mas não, já houve um papo, já se conhecem, já houve insinuações nas entrelinhas, brincadeirinhas, ela já riu daquela sua piada sem graça, CACETE, tá esperando mais o que? Mas não. A pessoa fica lá, dãããã. Ou então demonstra algum interesse e corre. Aí você desiste. Aí vem e cutuca mais um pouco, "oi, eu tô aqui, olha pra mim". Aí corre. APA, viu.

Por exemplo. Você fica de marcar um encontro com um grupo de amigos. Um deles - que te desperta algum nível de interesse - de repente começa a te perguntar "e aí, quando vai rolar?". Começa a te ligar pra falar sobre coisas de trabalho. Pergunta coisas que você JÁ disse. Puxa assunto do nada em algum messenger da vida. Aí cobra de novo o tal do encontro. QUÉDIZÊ, você pensa "nesse angu pode ter caroço", né? Vamos investir. Aí você marca o tal do encontro, por causa de imprevistos o povo dá pra trás em cima da hora, mas você se mostra disponível - pô, vamos tomar uma (coca cola, no meu caso, já que não bebo cerveja), o que que tem demais nisso? Trocar ideias, conversar, espairecer. Aí a pessoa te diz "É, melhor deixar pra semana que vem então". Oi? Qual o problema? Eu fico pensando se eu tenho um papo tão imbecil assim ou se a pessoa tem medo de ficar sozinha comigo (num lugar público, oi?), porque né, realmente não me passa nada pela cabeça muito coerente além disso. Não tá a fim? Não dá corda. Tá a fim? Então não paga de mocinha envergonhada, porra.

Ai que saudade dos homens que tinham atitude de homem. Daqueles que chamavam pra sair - mesmo que você não quisesse, era só dizer "pô, não dá", eles já entendiam a mensagem e a amizade continuava. Mas agora não. É um tal joguinho de mostrar interesse, não mostrar interesse, vai não vai, quer não quer que me irrita profundamente. Eu sou antiquada. Velha. Quadrada. Gosto de ser cortejada. Gosto que o homem tome a iniciativa. Não sou uma mulher pós-moderna e bem resolvida (no sentido pós-moderno da coisa), que vai em cima do homem que lhe interessa. Não. Eu gosto de gentilezas, gosto de sutilezas, de homens com atitude, que mostram a que vieram. Principalmente: que SABEM o que quer - ô coisa rara hoje em dia. Cada vez mais perco a paciência com essa mistura de comportamento, onde não há mais papeis claros a serem desempenhados. Não falo essa língua não, na boa.

O problema provavelmente deve ser comigo. Eu que atraio homem banana, é a única explicação racional que consigo conceber. Meu histórico demonstra isso, o último cara com quem me envolvi e que tinha atitude de começar e terminar alguma coisa foi aos 18 anos, ou seja...

Rapidinha

Não, esta bagaça não tá abandonada, embora pareça. É verdade, eu tenho andado mais pelo Facebook e pelo Twitter do que por aqui - a facilidade das redes sociais. Pra escrever num blog, é preciso ter assunto e tempo pra desenvolver as ideias. Assunto a gente inventa, agora, tempo pra desenvolvê-lo... Aí pega. Por isso eu tenho me rendido à rapidez estéril do Twitter e do Facebook. Eu tenho uma dissertação pra escrever, um relatório pra preencher pra CAPES e produção pra apresentar, ou seja... No way. Sem condições de escrever mais do que algumas linhas de bobagens soltas por aí.

Maaaaas, pra não deixar esta coisa às moscas, às vezes eu separo um tempinho pra rabiscar algumas reclamações ou, como neste caso, pra trazer algo que li em outro lugar. Mas - putz grila - tinha que ser tão meu? Tinha que ser tão eu?

Então vá, se quiser ir. Te dou mais uma chance para me esquecer, se apaixonar por alguém, se reapaixonar, quem sabe. Também tentarei fazer o mesmo, é hora de tocar a minha vida sem você. Quem fica, fica por vontade própria.
Te dou um tempo sem mim, me dou um tempo (doído) sem você. E quem sabe um dia você descubra se tudo isso te significou alguma coisa, se foi de verdade. A diferença entre a gente é que sei que ainda me lembrarei de ti em dez anos e talvez você esqueça meu nome. Porque não sei exatamente se pra você fui amor ou fogo de palha.
Então vá, não vou pedir pra ficar, não vou mais desejar que me peça para ficar. Não farei mais perguntas, engolirei um silêncio seco, feito bola de pelo na garganta. Porque é melhor assim, não é mesmo? Não.
Talvez você tenha razão, talvez eu tenha inventado um amor que só existiu dentro de mim. Talvez um dia eu olhe para trás e perceba o quão infantil eu fui, logo eu, sempre tão madura emocionalmente.
E eu te desejo algumas coisas. Que seja feliz, de verdade. Que um dia encontre alguém que consiga amar e que não te machuquem. Desejo coisas do passado também, como por exemplo, ter sido capaz de acelerar teu coração, de te dar nós na garganta, de te fazer sorrir sozinho antes de dormir. Desejo ter frequentado alguns sonhos seus e atormentado alguns pensamentos.
E desejo, acima de tudo, que se um dia quiser voltar, que venha de coração aberto. Que nunca esqueça o quanto te gosto. Que não tenha medo de me mandar uma mensagem no meio da noite dizendo que sente saudade, se sentir. Que não tenha receio de me bagunçar outra vez, se perceber que é de verdade. Você conhece meus caminhos, então venha, se quiser. E permita se perder em mim.
Eu já entendi teu silêncio, então pode ir tranquilo. Fica bem, eu também vou ficar, cedo ou tarde. E se ainda for importante para você, não me deixa te esquecer; se passar muito tempo, posso ter endurecido demais. Se nossos caminhos ainda estiverem cruzados, te vejo em breve, quem sabe. Se não, se cuida e me esqueça aos pouquinhos.

E se permita amar um pouco mais.


*E a música tema deste post, pra mim, seria "A Sua", da Marisa Monte. A maldita música que me faz chorar desde 2002, e que, sei lá porque cargas d'água, ultimamente várias pessoas resolveram relembrar no Facebook. Só pra me atormentar. Quando eu digo que tem alguém lá do outro lado (em cima ou embaixo, anyway) que adora curtir uma com a minha cara...

Religare?



Então, acaba sendo meio inevitável eu retornar ao tema religião, porque no fim das contas é o que eu estudo, e acho que é a área onde tenho opiniões mais polêmicas – e, pra alguns, contraditórias.

Eu acho que se os religiosos em geral lessem um pouco sobre a construção da verdade segundo Foucault muita aporrinhação seria evitada – ou pelo menos diminuída. Vamos lá, meu povo, verdades são construídas segundo relações de poder. Nem vou enveredar por aí porque não sou grande especialista no careca, mas basta dizer que, resumidamente, você aceita para si a verdade que lhe convém. Se lhe convém acatar tudo que o pastor/padre/rabino/pai de santo/xamã diz, essa vai ser a sua verdade; se lhe convém acreditar na Grande Abóbora, essa vai ser a SUA verdade. O problema é quando você cisma que essa verdade tem que ser a dos outros também. E, pior, quando cisma que a SUA verdade, da forma como VOCÊ a concebe, é a única. Veja bem, mesmo dentro de uma mesma igreja pode haver mais de uma forma de entender a doutrina. Então quem garante que você tá certo?

Eu sempre impliquei com a ideia de evangelização. Desculpa, mas é verdade. Já disse aqui algumas vezes que sou metodista porque admiro profundamente as ideias de John Wesley, mas que minhas opiniões não representam de forma alguma os princípios da Igreja Metodista – mas não custa lembrar. Eu leio, ouço, reflito, passo em vários filtros, e daí retenho o que me parece mais coerente e descarto o resto. Ou seja: minhas opiniões representam única e exclusivamente os MEUS pensamentos. Não me venham imputar cargas que eu não me comprometi a carregar. Não sou pastora, nem assessora de imprensa ou porta-voz pra falar pela instituição. Mas voltando ao lance da evangelização; sorry, irmãos, mas eu não concordo muito com a ideia de evangelização não. Acho que as ideias de Jesus (coloca aspas aí – não há registro de que Ele tenha deixado algo escrito, aliás, na verdade, muito provavelmente Ele era analfabeto) não são pra CONVENCER ninguém. Cantar em trem ou ônibus, entregar papelzinho na rua ou bater na porta das pessoas domingo de manhã, estatisticamente falando, mais queima o filme dos evangélicos do que dá algum retorno do tipo que vocês esperam. Sério mesmo. Conheço muita gente traumatizada, que desenvolveu verdadeiro preconceito com religiosos. E não me venham com aquela ideia de “religioso vazio” e talz, vocês sabem do que estou falando.

Eu poderia discorrer por horas sobre o assunto (mentira, não poderia porque vou sair daqui a pouco e provavelmente nem vou terminar este texto agora), mas basta me ater a alguns pontos importantes, que, aparentemente, são ignorados pela maioria.

Primeiro: a Reforma não rompeu com aquela ideia de intermediário entre Deus e os homens? Depois da Reforma o papel dos padres – ou, no caso, dos pastores – não passou a ser de simples condutores (daí, inclusive, o nome) , ao invés de porta-voz de Deus? Todo mundo não tem acesso à Bíblia? Então porque diabos (ops) vocês cismam que alguém para estar “salvo” precisa estar enfiado numa igreja? A Bíblia não diz isso em lugar nenhum, se bem me lembro. Na boa, certas pessoas que conheci dentro de um templo desvirtuariam o próprio Jó facilmente (ele, também, uma construção, diga-se de passagem). Eu não preciso ouvir o pastor para ter comunhão com Deus. Precisaria dele caso tivesse alguma dúvida doutrinária ou precisasse de aconselhamento (ou poderia pagar um psicólogo, wathever). Eu gosto de ouvir pregações, quando o cara sabe do que tá falando. Eu acredito piamente que Deus pode (veja bem, PODE, não que sempre o faça) falar através de um pastor, durante uma pregação. De verdade. Agora, se começar a me ameaçar com o inferno por não concordar com coisas que ele INTERPRETOU aí vai começar a me lembrar muito os padres pré-Reforma e meu Lutero vai querer pregar papeis nas portas das igrejas. Melhor evitar, vai por mim.

Segundo: a Bíblia tem três aspectos, e pelo menos dois deles são em geral ignorados: ela é um texto sagrado (eu ia colocar uma definição aqui, mas né, isto não é um artigo); ela é uma obra literária; e ela é um documento histórico. Antes que me taquem pedras, vamos pensar (fazer isso de vez em quando faz bem e não dói, acreditem). O status de livro sagrado é inquestionável, pelo menos para os seguidores das diversas linhas de cristianismo existentes por aí, então nem vou me alongar nisso. Ela é uma obra literária porque é composta de diversos gêneros literários diferentes, compilados em diversas épocas, em comunidades diferentes (surpresa! A Bíblia não caiu do céu pronta, ela foi construída). E, talvez o mais chocante para teístas e ateístas, ela é um documento histórico sim – na medida em que representa a mentalidade da época (ou das diversas épocas) em que foi escrita, e contém eventos com alguma plausibilidade histórica (esqueçam essa ideia de “prova histórica”, mesmo fatos podem ser montados). Pensando nesses três aspectos, sem ignorar os que nos convêm, podemos chegar aos seguintes raciocínios: 1 – A Bíblia contém erros sim. Contradições às vezes muito claras. Pedaços de texto soltos e fora de ordem. Podem me chamar de herege, mas qualquer leitor atento percebe isso. É impossível uma obra humana, por mais inspirada que seja, sem erros. 2 – A Bíblia não deve ser entendida de forma literal, até porque os eventos que ela narra – mesmo os que contêm alguma parcela de plausibilidade histórica – em sua grande maioria foram escritos anos, décadas, às vezes séculos depois de terem ocorrido. E mesmo com a cognição peculiar da cultura oral, diferente da nossa, ninguém tem memória de elefante. 3 – A Bíblia é repleta de pegadinhas do tipo “parece mas não é”. Marcos não escreveu o Evangelho de Marcos. Mateus não escreveu o Evangelho de Mateus. Lucas... Bem, a ideia é a mesma. Na antiguidade era usual atribuir um texto a algum nome importante para dar a ele, o texto, autoridade. Não à toa várias cartas paulinas são contraditórias; além de interpolações posteriores, algumas simplesmente foram escritas por outras pessoas, muitas décadas depois da morte de Paulo. Aí nós vemos mulheres na liderança das comunidades, ensinando e pregando em algumas passagens, e em outra sendo avisadas para “manter silêncio”. Como eu não acredito que Paulo tenha sido esquizofrênico, nem sofresse de dupla personalidade, é bem provável que tenha havido acréscimo de copistas nisso aí.

Enfim, como eu disse a discussão é longa, e eu poderia discorrer sobre ela durante bastante tempo. Eu continuo tendo minha fé, mas realmente é impossível dissociá-la do raciocínio lógico, da razão, e dos questionamentos. Afinal foi o próprio Wesley que disse: “Nós temos o princípio fundamental de que o renunciar à razão é renunciar à religião, que a religião e a razão caminham de mãos dadas e que toda religião sem a razão é falsa.” A diferença é que eu não tenho a menor necessidade de convencer os outros de que a minha verdade é a única – até porque eu sei que não é. Tenho consciência da minha pequenez e das minhas limitações pra chegar a esse nível de megalomania. Acredito num Deus soberano – logo, Ele não precisa de mim, seja como advogada, seja como assessora de imprensa e muito menos como porta-voz. E, se você não acredita que Ele exista, se Ele quiser, Ele te convence do contrário. Com uma palavra dita por mim ou lida num outdoor. Se Ele não quis até agora... Quem sou eu pra tentar forçar?

Escrevi este texto já há uns dias, mas não tive tempo de postá-lo antes. Então, se eu não for queimada por heresia, qualquer dia desses eu volto.

Dos outros (mas que bem poderia ser de mim)



A verdade

- Mas o que você espera de mim?

- (Que você pare de varrer todo esse seu amor pra debaixo do tapete, tentando convencer a si mesmo de que não vale a pena lutar por algo que te toque fundo demais. Que você aprenda a ouvir seu coração, ao menos uma vez na vida, e decida em nome dele ao invés de ouvir todo esse seu medo. Que você não tenha receio de mergulhar em uma história bonita só porque não existe um futuro perfeito neste momento. Não existe futuro pra nada, não há garantia pra amor nenhum. Espero de você um pouco de honestidade com você mesmo, que me fale duzentas vezes o que me dizem seus olhos e as letras das músicas que você me manda, se escondendo atrás desse monstro que você não sabe lidar. Espero que segure firme meu rosto e me beije no meio da rua, na frente de todo mundo. Que dance na chuva comigo. Que me beije o rosto e as mãos, sem se arrepender de mostrar amor. Que me olhe deitado na cama ao meu lado e emaranhe seus dedos nos meus cabelos. Que corra dois dedos pela minha coluna e me beije a nuca enquanto assistimos à alguma coisa na tv. Que me abrace depois do sexo e diga qualquer coisa dessas que você tanto evita. Que explique o que são essas tantas coisas que você gosta em mim e não discorre. [...] Que você me espere na porta da minha casa e não me diga absolutamente nada que eu não consiga entender através de um beijo desses de portão. Que você nunca mais me deixe ir embora. Que nunca mais escolha o certo, só porque o errado é loucura demais. Que você seja um pouco egoísta sim, e me peça pra ficar com você, porque é por mim que seu estômago esfria, porque é por mim que você confunde as palavras, porque é em mim que você pensa quando o coração acelera. Quero ser a primeira coisa que você pensa quando acorda, e a última antes de dormir. Quero atormentar a sua memória com as nossas melhores cenas, como você atormenta a minha. Quero que nunca me tire desse patamar de melhor amor, de melhor desejo, de melhor destino. Quero que nunca se esqueça do quanto sente falta da minha pele e do meu beijo. Quero que pare de desdenhar tudo o que eu te digo, pra ver se me supera mais rápido. Você sabe que não. Você sabe que sou o que você sempre quis, enrolada em um roteiro de Woody Allen. Você sabe que eu tenho tudo o que você vem desejando há muito tempo, e descobriu que é tudo verdade. Quero que pare de varrer tudo isso pra debaixo do tapete e que venha. E me tira o fôlego de novo. E me invade. E não luta. Não luta. Quero tudo isso, enquanto ainda te quero…)
Nada. Sei que eu não posso esperar nada de você…

Silêncio. Ela engole seco o azedo das palavras mastigadas. O coração dele aperta. Guarda coisa demais lá dentro.

Marcha, soldado, cabeça de papel...


Se eu for escrever aqui sobre todas as marchas que tem havido, o texto vai ficar grande demais. Então vou me ater à guerra que tem sido travada entre dois grupos: homossexuais e evangélicos.

Antes de mais nada, deixa eu explicar umas coisas. Primeiro: embora esteja ausente há algum tempo de templos, ainda me considero evangélica (crente, protestante, whatever), e ainda admiro as ideias pregadas por John Wesley e propagadas pela Igreja Metodista. Mas, de forma alguma, o que eu digo representa o que é ensinado nessa instituição. Eu sei ler, graças a Lutero tenho acesso à Bíblia (aliás, por causa do mestrado, nos últimos meses eu tenho tido mais acesso do que gostaria, diga-se), e sei pensar sozinha, muito obrigada. Represento minhas próprias ideias e pensamentos, não uma instituição. Eu ouço, filtro, e, de acordo com minha consciência e experiência de vida, resolvo o que me parece coerente ou não. Se você acha que pra seguir alguma religião tem que baixar a cabeça pra tudo que o dirigente diz e concordar com tudo o que é pregado, melhor fechar esta página e ir ler as novidades da Igreja Batista da Lagoinha.

Segundo: Eu defendo o direito inalienável ao respeito pela opinião alheia – e pelo direito de fazer o que bem entender da própria vida, desde que não agrida o outro. Eu não tenho absolutamente nada contra os gays, inclusive conheço alguns que são pessoas maravilhosas – melhores, aliás, que muitos crentes que já vi por aí. Confesso que acho estranho gays se beijando, sejam eles homens ou mulheres. Acho, sim. Mas isso tem a ver com minha criação, com o mundo em que vivi grande parte da vida. Jamais vou discriminar ou maltratar alguém por causa disso, nem condenar ou dar lição de moral. Quem sou eu pra dar lição de moral em alguém? Tenho meus próprios motivos pra ser repreendida, como todo mundo. Quem não tem pecado que atire a primeira pedra – lembram disso?

Isto posto, vamos a algumas coisas que eu tenho visto e que me incomodam muito. Vou começar com o que é considerado atualmente como o politicamente correto, e voltar minha metralhadora giratória aos evangélicos (se com tudo que eu já escrevi até hoje sobre minha própria visão de mundo, igreja e religião ninguém tentou me exorcizar ou me impedir de entrar em algum templo, mais uma opinião polêmica, menos uma, que diferença vai fazer, né?). Eu escrevi isso há algum tempo no Facebook, e cada vez tenho visto mais motivos para repetir: VOCÊS ESTÃO FAZENDO ISSO DE UM JEITO MUITO ERRADO. Esse discurso do “nós amamos os homossexuais mas não amamos o homossexualismo” é vazio. Desculpa. Eu entendo o princípio, mas a argumentação tá furada. Ok, eu posso dizer que amo os matemáticos mas odeio a Matemática. Opinião registrada, eles vão continuar muito bem, obrigado, vivendo a vida deles do jeito que acham que devem viver. Com os homossexuais é quase isso. A ideia que o discurso de vocês tá passando é “olha, eu amo você, mas tua passagem pro inferno já tá comprada, viu? Malzaê”. Amigo, o que o cara faz entre quatro paredes é da tua conta? Por acaso ele se mete na forma como você transa com a tua mulher? Pense bem. Eu acho que a resposta é não pra ambas as questões. “Ah, mas Deus vê tudo!” Ok, então deixa que Ele resolve o que vai fazer com a vida (ou a alma) do camarada, e para de se oferecer como porta-voz do Divino. Ou, pior, como promotor – se eu bem me lembro, quem exerce essa função é outra figura, ex-angelical. Qual o problema de dois homens ou duas mulheres andando de mãos dadas? Qual o problema deles se beijarem? Você se sente incomodado, como eu mesma já admiti que me sinto? NÃO OLHA. Simples, não? Resolve seu problema e deixa os outros serem felizes em paz. “Mas nossa função, dada por Jesus, é pregar o evangelho” e blá, blá, blá. De novo, se eu estou bem lembrada, a frase é “Ide pelo mundo e PREGAI o evangelho”, e não “OBRIGUE OS OUTROS A SEGUIREM o evangelho”. Percebem a sutil diferença? O pregai, nesse caso, não significa enfiar na cabeça dos outros à base de marretada. Pense nisso. Meu ex costumava dizer que Deus não precisa de advogado. Vão ajudar aos necessitados e falar do amor de Deus – porque, amor sim, é algo que tem faltado muito por aí e precisa ser propagado.

Então, agora que já dei motivos pra levar pedrada dos meus irmãos evangélicos, vamos fechar o caixão com o ódio dos LGBTSEGRKLHOXS (a cada ano essa sigla aumenta mais, não consigo acompanhar). Primeiro: independente do que minhas opiniões religiosas digam, o Estado é laico, então o que o Legislativo decide, eu cumpro. Sendo muito sincera, não esperem me ver comemorando a conquista do casamento gay, porque isso não me atinge em particular. Querem casar e a lei permite? Casem. Querem divorciar? Divorciem-se. Não vou levantar bandeiras, desculpem. Respeito cada um de vocês, a dificuldade que enfrentam, os preconceitos inclusive com agressões. Fdp é fdp independente de cor, sexo, gênero, religião ou condição financeira. Só o que tá me dando nos nervos é o uso desse preconceito – que eu sei que existe, não sou cega nem burra – pra um estardalhaço algumas vezes sem sentido. Pra que, por exemplo, retratar imagens de santos como gays? Pra desafiar a Igreja Católica? É assim que vocês esperam respeito, descendo ao nível de quem fala e faz merda? Desafiando quem acha que vocês são pecadores? Gente, na boa, relações homem com homem e mulher com mulher sempre existiram em qualquer sociedade, em qualquer tempo, mas aceitem, quando a Bíblia foi escrita – e pelas pessoas que viviam naquela época, naquela sociedade, e a escreveram – homossexualismo era ABOMINAÇÃO. Tá lá escrito, não sou eu que tô dizendo. Ponto. Se os caras acreditam nisso, deixa os caras, pô! CLARO, lembrando: deixa os caras desde que não agridam vocês. Respeito é o princípio primordial da boa convivência em sociedade, e isso tá além de religião. Muitos de vocês acham os religiosos boçais e ignorantes – e isso nem tá ESCRITO em lugar nenhum, imagina eles, que têm registro escrito. Fica difícil vocês conquistarem os religiosos pra causa de vocês – que eu acho justa – desafiando-os dessa maneira, ou querendo, por exemplo, casar na igreja. Entendam: religiões são feitas de DOGMAS. Não dá pra você se meter numa religião sem acreditar PELO MENOS nos princípios fundamentais dela. Não dá pra eu ser cristã se pra mim Jesus foi só uma historinha inventada por um imperador romano. Não dá pra eu ser do candomblé se eu sou contra sacrifícios de animais. Não dá pra eu ser kardecista se não acredito em espíritos. Captaram? “Ah, mas existe uma igreja que casa homossexuais”. Sorry, mas não é igreja. É uma seita. Como eu já disse pra uma amiga, se você pegar trechos descontextualizados da Bíblia, você pode provar quase qualquer coisa – desde ET’s até que Deus não existe ou é um cara muito, mas muito ruim. E o contexto, no caso homossexual é: os judeus do I século não admitiam a prática. Ponto. Não só por julgarem anti-natural (por favor, estamos falando de I século, não me venham com ladainha sobre o que é “natural” hoje), como também porque era comum a várias outras sociedades e os judeus tinham uma coisa de querer ser diferentes (é, estou sendo simplista pra economizar espaço e tempo). Esse é o contexto. Estou estudando o livro de Levítico, e o texto que se posiciona contra a prática é muito claro (pelo menos no que se refere a homens, que era quem realmente importava pra época). Isso afeta seu dia a dia? Desde que não joguem uma Bíblia na sua cabeça, eu acho que não. Então, queridos, espalhem a alegria de vocês pelo mundo, beijem muito na boca, lutem pelos seus direitos, mas parem de desafiar os que não entendem ou não concordam. Sejam magnânimos e deem aquilo que eles não sabem ou ainda não conseguem dar a vocês: respeito. Todo mundo tem limitações. Vocês também as têm. Subam no salto, façam a egípcia e finjam que não está acontecendo nada. Porque se vocês respondem no mesmo tom, acabam perdendo a razão.

Enfim, o povo anda por aí fazendo marcha a torto e a direito, pra cima e pra baixo, sem refletir muito no que fazem, falam, ou as ideias que estão passando pros outros – que muitas vezes acabam sendo um tiro no pé. Antes de quererem tirar o demônio do meu corpo ou me acusar de lésbica enrustida, parem, pensem, reflitam nas bandeiras que estão levantando e, principalmente, no PORQUE e COMO as estão levantando. Não sejam como o soldadinho com cabeça de papel da cantiga infantil.

Sobre o aborto



Então, passada a fase da frescurite aguda (mentira, mas cansei de falar nisso - "Supere isso e, se não puder superar, supere o vício de falar a respeito", já dizia Caio Fernando Abreu)...

Semana passada, na aula de Sociologia, no meio das discussões surgiu o assunto aborto - e esse é um tema polêmico em qualquer lugar, a qualquer tempo. Há muito que ser pensado quando se trata de concordar ou discordar de algo assim. As questões morais envolvidas são muitas, as religiosas, nem se fala. Então eu vou escrever aqui algumas coisas que penso a respeito desse assunto espinhoso.

Pra começo de conversa, religiosamente falando, eu sou contra - exceto em casos de violência sexual ou em casos em que a vida da mãe corra riscos. Mas religião é aquilo, ou você tem, ou você não tem, então vamos pular essa parte e vamos às questões morais e práticas em se tratando de sociedade brasileira.

Um dos principais argumentos favoráveis é o fato da mulher poder dispor de seu corpo como bem entender. Mas até que ponto é do corpo da mulher que estamos falando? A partir de quando o feto pode ser considerado um ser vivo - e aí não é do corpo feminino que estamos falando, mas de um outro corpo, o corpo de um ser que momentaneamente é dependente daquela mulher? Ok, um cachorro, uma árvore também são seres vivos, e aí? Um feto pode ser considerado um indivíduo? E o chamado "sofimento fetal", que acontece em algumas situações quando há complicações no parto? É muito delicado determinar até onde vai o direito da mulher de agir sobre seu corpo e onde começa o direito de uma criança que ainda não nasceu. É quase como determinar quando começa efetivamente a vida - porque, a partir daí, seria assassinato. O enrosco moral que cerca esse tema tá longe de ser resolvido.

Agora, falemos sobre assuntos práticos; não é melhor liberar o aborto ao invés de presenciar a multiplicação de menores infratores, pais que abandonam seus filhos em lixeiras ou crianças que muitas vezes ficam trancadas em casa sozinhas, à mercê de qualquer tragédia, sem nenhum adulto que olhe por elas? Seria, se isso significasse a diminuição de todos esses fatores - e aqui eu falo da realidade brasileira. Ah, a camisinha estourou, bebi demais e não pensei nisso na hora, o tesão era mais forte do que a precaução... Pílula, conhece? Pílula do dia seguinte, já ouviu falar? É mais barato do que um aborto, seja ele legal ou não - e causa menos estragos pra todo mundo. Sejamos francos: alguém que não tem dinheiro pra comprar uma camisinha, que custa aí menos de R$ 2,00 (e pode ser obtida gratuitamente em postos de saúde!), ou um outro contraceptivo qualquer (a chamada "pílula do dia seguinte" resolve todas as desculpas da camisinha que estoura, da bebida ou do excesso de tesão), vai ter dinheiro pra pagar uma intervenção cirúrgica como o aborto? Ou, no caso dele ser oferecido pelo Sistema Único de Saúde, sejamos realistas; nossos hospitais públicos mais parecem matadouros do que lugares onde vidas são salvas. É recorrente na mídia reportagens sobre a falência do sistema público de saúde, com pacientes abandonados em corredores sem o mínimo de higiene, e outros que são mandados embora pra morrer em casa. Que condições esses lugares podem oferecer no caso de milhares de mulheres fazendo fila em suas portas, querendo tirar de dentro de si um feto - que, com um pouco mais de cuidado e atenção, não teria sido posto ali? Pessoas esperam MESES por uma simples consulta, quanto mais por uma cirurgia; no caso de uma gravidez, essa espera não pode ser longa ou o aborto não pode mais ser feito. Aí tiramos a vaga de alguém que depende de uma cirurgia pra sobreviver pra dar lugar a uma irresponsávei que daqui a seis meses pode estar lá de novo, na mesma situação. Ah, me poupe.

Talvez eu seja muito dura com alguns assuntos, com a realidade da maioria das pessoas. Talvez minha visão seja muito antiquada, tacanha, radical. Pode ser. Mas o que eu vejo é um monte de gente que não tem um pingo de bom senso pra cuidar de si mesmo, muito menos de uma criança. Sou mais favorável à esterilização (ok, me chamem de facista) do que ao aborto. Não tem condições de ter filhos, não pode cuidar? Então faça laqueadura das trompas - uma intervenção bastante simples e rápida, bem mais que o aborto, e que pode esperar alguns meses pra ser feita. Amanhã ou depois conseguiu condições? Adote. Há milhares de crianças por esse Brasil afora precisando de um lar e de carinho. Agora, aborto não vai resolver a situação dos brasileiros pobres que procriam mais do que coelhos, se esses mesmos pobres não se preocupam sequer em usar contraceptivos pra prevenir que mais e mais crianças sejam jogadas nesse mundo sem um pingo de condições de vida.

Religiosamente eu sou contra, moralmente eu tenho uma certa margem de dúvidas. Mas, sendo pragmática, a verdade é que tornar o aborto uma prática legal no Brasil provavelmente vai criar ainda mais problemas do que soluções para os que já existem. Se não houver uma mudança de postura e uma radical educação sobre os meios de se evitar uma gravidez indesejada, o aborto só vai tornar nosso sistema público de saúde mais saturado, e vai acabar gerando uma revolta na população que acha que pode fazer filho como quem troca de roupa, com a falsa garantia de que em qualquer hospital vai poder resolver isso - assim, como quem toma uma aspirina pra dor de cabeça.

* Pausa para descanso finda, de volta aos estudos... "Vejo" vocês sei lá quando, meus dois ou três leitores.

De outros

Pra encerrar o assunto:

‎"Não é o sentimento que se esgota, somos nós que ficamos esgotados de sofrer, ou esgotados de esperar, ou esgotados da mesmice. Paixão termina, amor não. Amor é aquilo que a gente deixa ocupar todos os nossos espaços, enquanto for bem-vindo, e que transferimos para o quartinho dos fundos quando não funciona mais, mas que nunca expulsamos definitivamente de casa."
(Martha Medeiros)

E isso acontece tão poucas vezes na vida...

Enfim. Voltamos a nossa programação normal.

Pequeno surto entre-músicas

Eu preciso de uma noite inteira dançando, a dança como catarse pra esquecer o que eu não consigo mais fingir que não está dentro de mim. Eu preciso de uma pista cheia de gente bêbada, com luzes piscantes e música ensurdecedora, pra me fazer esquecer do seu rosto, um rosto que povoa minha memória, meus pensamentos, a cada respiração eu penso em você, em como eu gostaria que você estivesse aqui, dançando comigo, rindo, celebrando comigo. Minha alegria não é completa sem você, não é mais do que uma mera sombra do que já senti um dia. Sonhei com você esta noite, e você estava tão triste e chorava no meu colo, e eu tenho vontade de chorar só de me lembrar disso. Como você está agora? Não sei, não faço a menor ideia. Não sei se está bem, não sei se está feliz ou triste, ou preocupado, ou sequer se ainda pensa em mim. Eu tento, juro que tento esquecer você, com tanta força como jamais tentei fazer qualquer coisa na vida. Entrego-me à catarse, danço de olhos fechados e atraio olhares, surpreendendo até quem me conhece há muito tempo, tal é minha entrega à dança. Preciso fugir de mim e do tanto de você que ainda existe em mim – eu não consigo separar quem sou eu e quem é você dentro de mim. Sim, eu bebi. Não o suficiente pra perder o ferrenho controle que mantenho sobre mim mesma – só você consegue fazer isso, pode contabilizar na sua lista de conquistas mais esta –, mas só o suficiente pra conseguir ficar um pouco alegre, o que tem sido difícil ultimamente. O suficiente pra tentar vencer a dor ainda que momentaneamente, a saudade que a cada dia me corrói, como se fosse um câncer, devorando cada célula do meu corpo. Danço, danço além do que minha combalida resistência física e respiratória permitem, dancei até ficar sem ar, até passar mal por não conseguir mais respirar. Dancei pra tentar te esquecer – mas cada letra de música canta teu nome, cada vez que fecho os olhos é teu rosto que enxergo. Luto contra mim mesma, luto pra esquecer tudo, luto pra tirar o que ainda há de você dentro de mim, mas é como me matar lentamente. Enfeito-me, seduzo, sorrio, mas tudo me parece vazio. Procuro seu rosto em todos os outros rostos. Sinto as lágrimas assomarem aos olhos com muito mais frequência do que gostaria, e mesmo agora, quando fugi por um momento da minha pseudo-alegria , sinto vontade de chorar por pensar o quanto estaria mais genuinamente feliz com você aqui comigo.

Vou voltar a dançar. Preciso esquecer de mim e de você, porque, dentro de mim, por mais que eu tente negar e esquecer, nós somos um só, e você está aqui comigo. Ainda que sua presença esteja apenas na ausência, ainda que eu tente negar e esquecer, você está sempre comigo.

Porque eu odeio o dia das mães e dos pais




Podem me chamar de insensível, podem achar absurdo, mas eu não suporto essas datas comerciais. Cumprimento por educação, por tradição, mas detesto (a data, não necessariamente cumprimentar quem curte e acha importante). Já mencionei o assunto quando falei sobre o Natal, e nem vou citar o dia dos namorados pra não dar margem a gracinhas. Mas e o dia das mães? E o dia dos pais?

Galera, na boa, essa visão cristã-romântica de que mãe e pai é a melhor coisa da vida nem sempre funciona. Em prol do aumento das vendas o comércio ENCHE NOSSO SACO o tempo todo nas semanas que antecedem essas datas, sem se importar com o sentimento das pessoas.

“Ah, mas mãe e pai são as melhores coisas que existem, e devem ser homenageados à exaustão no seu dia e blá blá blá”.

Ah tá. Então usa esse argumento pra uma pessoa que foi espancada pelos pais a vida toda. Pra alguém que sofreu abuso sexual do próprio pai. Pra alguém que foi abandonado numa lixeira (já que isso parece que virou moda), ou pra quem cresceu vendo os pais se drogarem e/ou se embriagarem. Pra quem viu os pais serem presos por assassinarem a irmã de cinco anos, como é o caso dos filhos do casal Nardoni. Explica isso pra alguém que tem a coragem de matar os próprios pais. Ou pra quem tenta entender como um pai ou uma mãe pode matar os próprios filhos.

Explica também como alguém que perdeu o pai ou a mãe recentemente consegue não se sentir deprimido e com choro fácil no meio de todo esse marketing sentimentalóide. Ou, pior, pra quem perdeu os filhos de forma trágica, como os pais dos adolescentes que foram mortos na chacina da escola em Realengo. Explica pra uma mulher, cujo sonho sempre foi ter filhos e não pode tê-los, como reagir nessa época. Ou pra uma que vê seu sonho de ser mãe se desmoronar diante de um aborto espontâneo.

Quem teve uma vida tranquila ao lado de pais carinhosos não precisa de um dia pra lembrar disso. Quem não teve, bem poderia ser poupado de toda essa avalanche de pressão midiática colocando sal em feridas que, provavelmente, nunca vão cicatrizar.

Meu momento coelho


Não é que eu tenha abandonado o blog.

Na verdade eu tenho dois problemas graves que têm me impedido de postar: a impossibilidade de acesso à internet (obrigada, Oi, GVT e Net!), e o fato de estar ligeiramente enrolada. Como eu sei que a tendência é que eu me enrole por completo (muito) em breve, é pouco provável que eu poste nos próximos dias (semanas, meses). Ou não também, pode ser que eu precise respirar, algo me chame muito a atenção e eu volte aqui pra postar qualquer coisa. Já tive ideias de textos, mas me falta tempo, e aí elas fogem.

O fato é que eu tenho tentado conjugar um mestrado e uma segunda graduação, além dos ensaios de um espetáculo de conclusão de curso e musculação - esta última anda bem defasada, coitada. Não tem sido fácil (minha orientadora e meu co-orientador dizem que eu preciso namorar - bem, não é exatamente esse o termo que eles usam - mas isso não é uma coisa que se mostra acessível no momento, logo, é algo em que não quero pensar). Portanto, se alguém ainda vem aqui que não seja por acaso (estripulias do Google), eu sinto muito. Nunca fui de ficar muito tempo sem escrever, mas o problema é que eu tenho sido obrigada a escrever DEMAIS nos últimos tempos - nada muito interessante pra maioria, a ponto de ser postado, eu garanto (a menos que vocês se interessem por Antropologia, Sociologia, Iluminação Cênica, História Comparada ou História das Religiões - sim, além do mestrado em História Comparada eu estou fazendo uma segunda graduação em Dança também. Não perguntem onde se encaixam essas disciplinas na graduação, tô pra ver formação mais variada que a de Dança). Quando muito eu ando reclamando pelo Twitter ou pelo Facebook, que é o que eu tenho acesso mais facilmente pelo celular.

Então eu vou ali porque o tempo urge, e eu tenho quase mil fotos pra editar antes de ir pra aula do mestrado - e ensaiar à noite.

Yo no creo en las brujas, pero que las hay, las hay...


Eu já acreditei em muita coisa ao longo da vida. Na verdade minha busca espiritual foi longa e, como uma pessoa curiosa e contestadora que sou, às vezes me parecia que seria infinita. Talvez seja mesmo, afinal, mas isso não vem ao caso. Graças a essa curiosidade, já pesquisei muitas coisas; ainda pré-adolescente comecei a ler um livro das minhas tias sobre "mestres ascencionados", algo a ver com chamas coloridas que nunca entendi direito. Houve uma época que quis ser bruxa e até escrevi para o Paulo Coelho - obviamente ele não tinha muito tempo para atender garotas de 14 anos.

Pesquisei também coisas mais "institucionalizadas", digamos assim. Conheço algo de Umbanda e Candomblé, mas a pluralidade me incomodava. Sempre cri num ser Único e Supremo, e por isso as entidades dos cultos afro-brasileiros me confundiam, pra dizer o mínimo. Por isso também meu interesse pela Wicca foi bem curto - ainda mais curto, eu diria, já que paganismo estava bem longe do que eu conseguia aceitar. Li as principais obras do Espiritismo, mas tudo me pareceu "científico" demais, quase acadêmico, e não era isso que eu queria. Até ir parar no que pode ser a maior contradição da minha vida, dados meu espírito e minha personalidade: o protestantismo. Lá eu sosseguei por muito tempo, e acho que, apesar de passível de contestação por alguns, por enquanto ainda continuo sossegada – embora os questionamentos e a insatisfação com as posturas adotadas pelos meus “irmãos” venham aumentando com o passar do tempo.

Mas uma coisa que sempre me acompanhou na minha fase pré-protestante foi o esoterismo. Sempre adorei incensos, signos, cristais, velas, todas essas coisas, e adoraria criar um gnomo no meu quintal (mas eles nunca me deram ideia). Obviamente, depois que adotei o protestantismo como linha religiosa, gnomos passaram a ser seres interessantes para aventuras de RPG, cristais ficam lindos enfeitando a estante (onde estão os meus), e velas são para serem usadas quando falta luz (ou num jantar romântico, ou ainda no “pós-jantar”, depende da imaginação de cada um – e eu tenho bastante). Mas algo sempre me chamou a atenção, e chama até hoje: signos.

Não falo de previsões ou coisas do tipo. Falo da relação entre o signo e a personalidade dos nativos. A parada voltou a me deixar cismada de uns 5 anos para cá, quando, durante um debate no corredor da faculdade, uma amiga de pouco tempo exclamou, exasperada: “para de ser tão escorpiana!!” Tipo, oi? Como assim? Aí eu voltei a pensar no assunto. E tenho pensado nisso sempre que vejo certas atitudes das pessoas. Por exemplo, eu já “previ” atitudes, reações e até respostas de pessoas que eu sequer conhecia, baseada na convivência que tive com outras de mesmo signo. Mas eu gosto de me usar como rato de laboratório, e em geral minhas análises são efetuadas sobre mim mesma.

Para exemplificar, recentemente num momento pra lá de insólito uma pessoa me disse: “que foi? (...) Não dá pra esconder nada agora”. E realmente não dava, e, raios, eu não estava escondendo nada! De onde saiu isso? A mesma pessoa já me disse que sempre tem a impressão de que eu estou escondendo alguma coisa. Gente. É óbvio que eu não tenho vocação para “big-sister” ou algo que o valha – até porque eu odeio ser julgada, e quero que a opinião dos outros sobre mim vá pro quinto dos infernos, juntamente com seus respectivos donos –, mas eu me exponho até demais na rede. A única explicação que encontro, embora possa não ser tão plausível assim para muita gente, é o ar misterioso associado ao meu signo.

Esse é só o exemplo mais recente que me fez pensar sobre o assunto. Mas se considerarmos que das quatro características principais que todos os sites, de uma forma ou de outra, atribuem aos escorpianos (escorpinianos, escorpianinos, whatever) – mistério, uma ligação extrema com o sexo, vingança e ciúmes – eu tenho com absoluta certeza pelo menos duas (e uma terceira dependendo das circunstâncias), acho que posso dizer que pode haver algo de verdadeiro nessa história. Se é coincidência ou não, eu não sei. Mas é fato que lendo certas coisas parece que estou lendo uma descrição de mim mesma. Como o texto abaixo, que eu copiei do portal do Terra há algum tempo (as descrições mudaram, pelo que pude ver há umas semanas). De um modo geral eu me acho bem parecida com isso (a parte de se atormentar, então! Quem escreveu esse trecho poderia ter se inspirado em mim); só não sei se quem me conhece concorda. :)

Não se deixe levar pelo preconceito. Se você cruzar com um tipo honesto, corajoso, íntegro, intenso, magnético, profundo, reservado, perspicaz, enigmático e fiel até que a morte os separe, corra e agarre esta oportunidade, porque você terá topado com um escorpionino. Seu astrólogo diz que os escorpiões são traiçoeiros? Mude de astrólogo, porque o escorpião tem um senso de lealdade só comparável ao de um mafioso siciliano - se você mantiver sua palavra, ele manterá a dele até debaixo de uma saraivada de balas. Sua melhor amiga diz que os escorpiões são don-juans incuráveis? Troque de amiga, porque o escorpião, embora tremendamente ligado ao sexo, é tão seletivo que prefere uma vida monástica a transar com qualquer um. Você andou lendo que o escorpião é um dissimulado? Largue esse livro pelo último de Agatha Christie, pois a notória reserva escorpionina não tem nada a ver com hipocrisia.

Um escorpião nunca mente, só omite - e na maior parte das vezes está repleto de razões, porque sua fabulosa antena psíquica pescou que o interlocutor em questão não é lá muito confiável. Esta, talvez, seja a principal característica deste signo cujo mito mais esclarecedor é o de Lúcifer, o anjo decaído, não por noitadas em excesso, mas por uma lucidez além dos limites: o grande pecado do escorpião, como o do ex-anjo, é um orgulho excessivo. Excessivo, mas não descabido. O probleminha de Lúcifer era que enxergava certas razões ocultas por trás da cantoria dos querubins - um desejozinho secreto de promoção naquele arcanjo que emitia uma nota mais aguda. Por isso ele acabou expulso do Paraíso, onde críticas não são facilmente digeridas. A mesma complicada sina ocorre com os terrenos escorpioninos: como eles são providos de uma espécie de olhar de raio X, que detecta as piores intenções até nos melhores sorrisos, acabam se tornando ossos duros de roer.

Um escorpionino tem um faro incomparável para imposturas, o que lhe torna difícil a vida em sociedade. Isto o transforma, muitas vezes, num introspectivo de cenho franzido: sua capacidade de captar algo de podre no reino da Dinamarca não tem paralelo, em todo zodíaco e em qualquer estatística. Mas se o escorpião saca tudo, inclusive o pior de cada um, é porque tem uma sensibilidade que chega às raias do insuportável. O que o torna, também, muito solidário com o sofrimento alheio - nada de estranhar que Ghandi tenha ascendente em escorpião. Um escorpião nunca foge de problemas. Não fuja dele, portanto, a não ser que você queira passar o resto da vida bocejando entediado.

(...)

O escorpião tem uma incontrolável tendência a se atormentar, culpando-se por tudo que dá errado à sua volta, e num raio de milhares de quilômetros além, Bósnia, Croácia e Cambodja incluídos. Como ele jamais pega leve, nem quando está de férias, esta mania de carregar o mundo e seus males pode se tornar meio desconfortável para aqueles que o cercam, e pretendem apenas tomar mais uma bebidinha e prosear. Como, igualmente, um escorpião nunca se lamenta ou faz o papel de vítima - o que ocorre muito com os outros signos de água, peixes e câncer - é preciso se tornar um telepata para saber exatamente o que vai mal com seu escorpião de estimação.

Se for uma mera insatisfação com tudo, deixe estar - isto não tem cura. Se for uma depressão profunda, daquelas que o arrastam para a cama (e não para fazer o que ele tanto gosta), algumas providências são necessárias. Nada de terapias de apoio, porque um escorpião jamais vai acreditar que ele está OK e o mundo está OK. Uma terapia de choque é a mais recomendável: uma passagem só de ida para a Iugoslávia, para trabalhar num campo de refugiados, ou um passeio às seis da tarde por qualquer dos pontos das grandes capitais brasileiras onde se concentram os menores infratores vai ajudar a reconhecer que há outros infernos ainda piores que seu inferno interior. Um pouco menos arriscada é a técnica de auto-análise. Todo escorpião é um investigador nato, e isto explica porque eles dão excelentes psicanalistas.

Em contrapartida, dão péssimos pacientes, já que nunca vão superar completamente a sensação de que aquele camarada sentado na poltrona atrás do divã está calado porque, no fundo, sabe menos do que ele. O escorpião lucra mais se pagar uma faculdade de psicologia em vez de honorários de um psicólogo avulso. É claro que às vezes não se pode esperar cinco anos escolares para resolver uma crise. Mas crises, na verdade, não atrapalham este signo. Ao contrário, ele precisa delas para se reciclar periodicamente. E acaba sempre levantando, sacudindo a poeira e dando a volta por cima.

Textos de Marília Pacheco Fiorillo e Marylou Simonsen, publicados no livro Use e Abuse do seu Signo, editado pela LP&M

Sobre livros


Daí que me deu vontade, já há uns dias, de falar sobre os últimos livros que li. A preguiça me dominou até agora, mas, finalmente, consegui vencê-la. Vamos a eles então.

A princípio, pra quem quiser espairecer com uma leitura descompromissada e linguajar leve, recomendo a série Percy Jackson e os Olimpianos, de Rick Riordan. Nos cinco livros o autor trabalha com a mitologia grega, expondo seus heróis – semi-deuses contemporâneos – às situações mais inusitadas possíveis, com direito a monstros destruindo escolas em perseguição aos protagonistas, viagem ao Hades (o mundo dos mortos grego) e um Olimpo encarapitado no andar de número 600 do Empire State (não, não existe esse andar. Leiam os livros pra entender). Os semi-deuses do autor têm TDA e dislexia, o que fez rolar uma empatia total (eu, um ser totalmente TDA e, se não com dislexia, provavelmente com discalculia)... Mas eu sou uma purista com relação à mitologia grega – dentro do que se pode considerar “purismo” numa mitologia –, e, por conta disso, extremamente desconfiada com livros e filmes que se propõem a tratar do assunto. No que se refere à personificação dos seres mitológicos, não tenho do que reclamar; o autor sabe trabalhar bem com o tema, e tem um conhecimento acerca dos monstros que me surpreendeu. Mas eu, enquanto um ser “da colônia”, percebo algumas posições políticas, algumas expressões estadunidenses do tipo que mais detesto. Por exemplo, o centro da ação, o ápice de tudo, se dá em Nova Iorque, mais especificamente na ilha de Manhattan. Ora, o Olimpo fica em cima do Empire State não por acaso! A explicação pra isso, no livro, é que os deuses gregos se mudam para as civilizações mais avançadas de seu tempo... Aham, Cláudia, senta lá. Eu sinceramente já enchi o saco de filmes como “O dia depois de amanhã” e “Independence Day”, onde os americanos são os grandes heróis da humanidade ou a raça eleita para preservar a vida na Terra – por essas e outras nem me dei ao trabalho de assistir a “2012”. Esse “American Way Life” me incomodou nos livros, mas, ignorando-o, é uma leitura leve e divertida.
Ainda no ritmo da leitura leve, Cidade dos Ossos, de Cassandra Clare, também é uma boa pedida. Primeiro livro de (mais) uma série de fantasia chamada Os Instrumentos Mortais, sua história gira em torno dos nephilins, filhos de anjos e humanos que estão na Terra para manter a ordem, impedindo que seres “das sombras” aprontem das suas. São uma espécie de "caçadores de demônios". É um romance-aventura adolescente, mas tem umas ideias muito boas, as cenas de lutas são bem orquestradas (eu particularmente tenho uma extrema dificuldade pra escrever cenas de batalhas – embora as adore –, e admiro quem consegue passar a tensão do momento através das palavras), e a autora sabe trabalhar o enredo de forma a reservar algumas consideráveis surpresas, especialmente da metade para o fim. Assim como a série dos Olimpianos, uma leitura leve, pra se passar um final de semana descansando, sem precisar exigir muito do cérebro.

Agora, se você gosta de literatura fantástica mas prefere temas mais adultos e profundos, A Batalha do Apocalipse, de Eduardo Spohr, é o que há. Escrito por um brasileiro (o que, por um lado eu lamento, já que isso indica que provavelmente jamais virará filme – o que pode ser bom, afinal, vide a merda que fizeram com Eragon –, e por outro me dá um orgulho tremendo, porque há tempos eu não lia algo tão bom de fantasia), lida com uma batalha de anjos, desde antes da queda de Lúcifer (o famoso diabo, pra quem não é ligado em mitologia cristã) até o pós-Armageddon, a batalha final entre o bem e o mal. O autor faz uma viagem histórica a diversas culturas, ressuscita desde a Babilônia da antiguidade, passa pelo Império Romano, China e Inglaterra medieval e por aí segue numa estrutura não linear, dando um leve toque de romance sem cair no pieguismo – ouso dizer que a personagem principal feminina é uma das melhores da literatura brasileira desde Capitu (e isso, vindo de mim, que idolatro Machado de Assis, é coisa pra caramba). A força, inteligência e personalidade dela são fascinantes. O autor consegue também deixar muito clara a extrema diferença entre as naturezas humana e angelical, mas, pra quem – como eu – tem uma ligação muito estreita com princípios cristãos, vai achar umas ideias levantadas por ele meio estranhas (pra dizer o mínimo). Aí é só relaxar e lembrar que é uma ficção e curtir o livro muitíssimo bem escrito e com um trabalho de pesquisa primoroso. Sem dúvida, um dos melhores livros que já li nos últimos anos. Mesmo pra quem não é muito fã de literatura fantástica, eu recomendo a leitura – depois me contem se gostaram ou não. ;)

Mulherada, Fora de Mim, de Martha Medeiros é algo assim tipo... De pensar “sou eu”. Martha Medeiros, como a maioria deve concordar, é uma cronista fabulosa, e nesse mais recente livro trata de uma dor que a grande maioria de nós conhece: a dor do fim, da separação, do relacionamento que não dá mais certo, mesmo a paixão ainda existindo em todo seu fulgor. O desespero, a luta diária que muitas vezes se aproxima daquela enfrentada por um drogado tentando se livrar de um vício (“um dia de cada vez”), a confusão de sentidos, a surpresa com o desenrolar dos fatos, as coisas estranhas que fazemos sem entender muito bem porque... Está tudo lá. E, homarada, recomendo a leitura. Acreditem, não é drama o que as mulheres fazem (ok, algumas EFETIVAMENTE fazem, mas isso não é regra). A natureza passional da maioria de nós, mesmo quando disfarçada por trás de uma imagem de frio desdém, é um turbilhão atormentador. Leiam. Vocês talvez entendam muitas atitudes que nós, mulheres, tomamos – afinal, elas agora são narradas, quase como num diário, por uma mulher.

E, livrinho que estou finalizando, só pra não deixar de mencionar minha atual paixão viciante (vide este post), Amantes e Rainhas – O Poder das Mulheres, de Benedetta Craveri. Mas, ok, antes de torcerem o nariz com “lá vem ela de novo falar de Luis XIV”, a coisa é mais ampla. O livro, na verdade, trata da influência de algumas mulheres que, à despeito do afastamento misógino destinado a elas no Antigo Regime francês, tiveram o poder de influenciar os rumos não só da França como, de certa forma, da Europa inteira. Estou me referindo a nomes como Catarina de Médicis, Margarida de Avois (a Rainha Margot), Ana da Áustria, Athénaïs de Montespan, Marquesa de Pompadour e Maria Antonieta, entre outras. É claro que, a princípio, meu interesse no livro recaiu sobre as mulheres que cercaram a vida do meu querido Rei Sol – Ana da Áustria, Maria Mancini, Maria Teresa da Áustria, Louise de La Vallière, Athénaïs de Montespan e Madame de Maintenon – e que, dada a longevidade do reinado de Luis XIV (72 anos, o mais longo do Antigo Regime europeu) e sua empolgação com o “sexo amável” (pra usar um termo da autora), obviamente ocupa uma boa parte do livro. Mas entender como as coisas se desenrolaram antes e depois dele, toda a configuração política, os homens e mulheres que, com suas atitudes, influenciaram uma época, está sendo deveras esclarecedor. Mais ainda, apesar de todo o preconceito com relação às mulheres que existiu durante todo esse período, constatar que mulheres inteligentes e fortes foram capazes de traçar seus próprios destinos – mesmo que algumas vezes tenha resultado em desastre depois. Isso meio que me esclarece porque o movimento feminista foi – e ainda é – tão forte na França. Eu sou suspeita, mas... Conheça o passado pra entender melhor o presente. ;)

Bom, é isso. Assim que terminar esse, vou tentar começar a ler Caim, de Saramago. Vejamos o que ele me reserva. :)

* Lendo tudo que eu posso enquanto posso... Depois que as aulas começarem, aí serão dois anos só lendo e escrevendo sobre judeus, fariseus, paleocristãos, Paulo...

De escritas e sentimentos – uma breve pausa


Acho que não posso me considerar uma escritora, na total acepção da palavra. Sei que escrevo. Faço isso com regularidade há alguns anos. Gosto e preciso da escrita, sempre foi minha válvula de escape. Se o que escrevo tem ou não qualidade pra que eu seja considerada uma “escritora” são outros quinhentos – e não vem ao caso, de todo modo.

Comecei este texto assim porque, quem me conhece há alguns anos, sabe que, se comparado aos meus outros blogs (inúmeros espalhados por aí) este tem sido surpreendentemente impessoal (já fui criticada por uma amiga por conta disso, inclusive; outra, por sua vez, acha melhor assim. Eu sigo conforme minhas necessidades do momento). Aliás, se é que eu consigo encontrar alguma característica nos meus textos é essa: pessoalidade. Em geral sou bastante intimista no que escrevo. Já escrevi de crônica a poesia (de versos brancos a sonetos), de crítica a romance, de textos transbordantes de sarcasmo e ironia até declarações de amor rasgadas. Tem tudo disso por aí, perdido na rede (e alguns guardados no micro, porque apaguei da WWW por nenhuma razão fixa, ou talvez por várias razões – simplesmente assim o quis). Já falei de política, religião, literatura, filmes, amor, paixão, saudade, elfos, História, dança e mais um milhão de outras coisas. Gosto de entremear meus textos com parênteses e hífens – eu preciso sempre explicar tudo muito bem explicado. É quase TOC.

Mas o fato é que, do meu último blog – o primeiro que efetivamente apaguei – pra este, uma mudança bastante considerável se deu, não só na escrita. Minha vida, meu pensamento, muitas coisas mudaram. E hoje, não sei exatamente porque, me deu vontade de escrever sobre isso. Sobre escrita. Sobre o que escrever significa pra mim, e porque escrevo. E porque parei de escrever sobre umas coisas pra escrever sobre outras.

Perdi as contas de quantas vezes mais de uma pessoa me perguntou “por que você escreve?” pelas mais variadas razões. A maioria que me perguntou isso achava que eu me expunha demais – não posso deixar de concordar. De certa forma era uma exposição, e eu nunca soube explicar direito o porquê disso. Uma espécie de voyeurismo invertido, talvez? Não sei. Mas eu sempre precisei expulsar coisas de dentro de mim escrevendo, e em geral elas vinham parar na internet. Poderia guardar num arquivo no micro; sim, poderia. Algumas coisas estão guardadas assim, inclusive. Mas há uma espécie de narcisismo em ser lida que só quem escreve pode realmente entender. Não tenho a intenção, nunca tive, de ser uma “blogueira conhecida”, ou algo do tipo. Basta alguns poucos leitores, mesmo pessoas que não sabem absolutamente nada de mim e chegaram aqui por acaso, numa busca qualquer na internet (alguns dos melhores blogs que já descobri e que sigo até hoje eu encontrei assim). Tanto que meus outros blogs não figuravam nos meus perfis em redes sociais, não eram tão fáceis de encontrar. Mas eles estavam lá, disponíveis a buscas fortuitas – e às vezes a buscas nem tão fortuitas assim, e em geral eu sabia exatamente diferenciar umas das outras. Não sei como acontece com os outros, mas palavras que são escritas e não são lidas, pra mim, soam como se nunca tivessem saído do pensamento. E isso é incômodo, porque eu escrevo justamente pra me “livrar” delas – é quase uma “penseira”, pra quem conhece o mundo de Harry Potter. Por outro lado, às vezes eu perco horas e horas relendo o que escrevi, seja recentemente, seja há alguns anos. É alguma espécie de auto-análise, sei lá.

Mas eu sou uma pessoa essencialmente apaixonada. Não lembro exatamente qual foi a última vez em que fiquei mais de um mês sem estar apaixonada por alguém. E, obviamente, meus blogs retratavam isso. Raivas, incompreensões, explosões passionais, saudades, enlevo – de tudo um pouco, registrado em palavras por aí. Menos de algum tempo pra cá.

Quando resolvi criar este blog, eu queria me desvencilhar disso. Queria trocar a intimidade pela análise da superfície (logo eu, que não suporto superficialidades!). Queria trocar a escrita de sentimentos por uma escrita quase “acadêmica”. E a passagem de um modo a outro foi tão radical que eu quase comecei a escrever aqui obedecendo às normas da ABNT. Mentira, não chegou a tanto. Mas a ideia era mais ou menos essa. Não que eu não estivesse apaixonada quando resolvi isso; talvez tenha sido exatamente o oposto. A questão talvez fosse estar experimentando um sentimento tal que já não cabia mais nas palavras. Coubera antes. E como. Escrevi praticamente um livro, muitos e muitos poemas e prosas, alguns textos que eu considero os melhores da minha vida (e, pelo meu grau desumano de exigência, são bem poucos) foram dedicados pra essa pessoa. É, deu um livro, eu tenho a coisa diagramada como tal. Mas chegou um momento de ruptura. Não o fim de um romance, não uma despedida, não uma traição, não o fim de um amor, nenhuma dessas situações folhetinescas (pelas quais já passei ao longo da vida). Simplesmente... Um momento de mudança. Ou talvez de entendimento. O que, no final das contas, não é necessariamente auto-excludente, pelo contrário. Eu diria que são complementares.

Ainda não sei exatamente qual a relação disso com o que eu escrevia antes. Ou como escrevia. Quando aconteceu, eu tinha algo em mente; hoje, vejo que vai bem mais além. Chamo de “ruptura” porque eu sinto assim. Durante algum tempo eu mantive dois blogs, um mais antigo e "pessoal", e este; há poucos meses essa ruptura se fez total, quando apaguei o blog anterior. Deletei totalmente, tirei da rede, disponibilizei o endereço. Me desfiz por completo – no mundo virtual, porque o backup dele está aqui guardado. Queria começar algo novo, precisava urgentemente mudar, precisava me desfazer de algo. Acho que, simbolicamente, queria me desfazer do sentimento de posse a que todos hoje em dia chamam de amor.

Eu tenho muito cuidado com essa palavra, esse verbo, o tal do amor. Raríssimas vezes meus amigos mais próximos me ouviram – ou leram – uma declaração assim vinda de mim. É um troço muito sério. E vai ficando mais sério com o passar do tempo, porque a maturidade vai me fazendo entender o que é de fato e o que eu um dia achei que fosse. É algo muito perigoso e pode machucar. Já confundi uma profunda amizade com amor romântico, amor homem-mulher, e o resultado foi que perdi ambos, o amigo e o namorado. Já disse a famosa frase “eu te amo”, no sentido romântico mesmo, basicamente pra quatro pessoas. Dessas, hoje vejo que só amei de verdade duas. E, mesmo essas duas, foram de formas tão distintas que eu chamaria os sentimentos de nomes diferentes, se meu vocabulário assim permitisse.

Posse. Talvez isso diferencie essas duas instâncias. É óbvio que quando você ama alguém quer ter a pessoa por perto. Quer tê-la ao seu lado. Mas isso é diferente de posse. Hoje eu entendo, quando vejo a primeira pessoa a quem eu realmente amei, que o que sentia na época era mais posse do que amor propriamente dito - eu era uma adolescente. Entendo isso hoje porque consigo ficar feliz por ele, por saber que conseguiu coisas que tanto almejava, como família, filho. Sinto saudades – não como homem, mas como um amigo muito querido, muito amado. Não, isso não é confundir amizade com amor; isso é o que sobra do amor, depois que o fogo da paixão se extingue, e você perde o sentimento de posse: amizade. É um querer-bem diferente, que nada tem de “erótico”, de físico, de passional.

Mas eu tenho aprendido um outro tipo de amor, o amor sem posse. Wow, não é nada fácil, viu. Até porque o raio da paixão não existe sem o sentimento de posse, e controlar isso é algo muito complicado. Mas não há nada melhor pra arrefecer uma paixão do que tempo e distância. Certo? Não necessariamente. Creiam-me, não necessariamente MESMO. Quando há alguma coisa maior por trás, a paixão pode até arrefecer, diminuir até virar uma brasinha tão pequena que você jura que já tá extinta, nem a sente lá. Mas experimenta diminuir a distância, tenta driblar o tempo. Nero ficaria com inveja, porque o incêndio de Roma perde. Ou seja, a questão não é a paixão. Aliás, é ela que imprime o sentimento de posse a que as pessoas erroneamente chamam de amor. Eu tenho entendido que eu posso amar alguém mesmo sem ter esse alguém comigo (não que eu não QUEIRA tê-lo, querer eu quero, mas nem tudo é como a gente quer; o lance é que eu não PRECISO tê-lo pra continuar amando-o). Mesmo se passar anos sem vê-lo. Mesmo que eu siga uma vida muito diferente da dele, diametralmente oposta, com outra pessoa, uma outra história. É pensar que, caso a vida nos jogue cada um num lado diferente do mundo, o dia que nos reencontrarmos tenho certeza de que vou pensar (e dizer): “Eu sei que teríamos sido felizes juntos. Mas, mesmo assim, ver você me faz feliz”.

Tendo entendido isso – embora muitas vezes a paixão ainda turve o entendimento e eu esqueça tudo por algum tempo –, acho que se deu a mudança. Uma mudança de dentro pra fora. Eu não preciso mais extrair os excessos desse sentimento, pra não ser sufocada por ele, como fazia antes. Agora já lido melhor com o silêncio. As palavras antes não davam conta; agora elas já quase não se fazem mais necessárias. Não escritas, pelo menos. Meu momento é de silêncio, porque ainda acontecem embates sérios e ferocíssimos dentro de mim pra aceitar essa ideia de amor sem posse. Preciso absorver tudo isso, porque não é algo fácil – talvez sequer compreensível pra alguém além de mim.

Por isso, voltamos à nossa programação normal.

Et vice Versailles!

Eu tenho uns vícios de temporada. Assim: em geral eu fico alguns meses (às vezes anos) lendo, ouvindo, pesquisando na internet tudo e qualquer coisa relacionada ao tema no qual estou viciada no momento – e a situação é tensa, porque eu passo realmente horas e horas e horas revendo, relendo, reouvindo as mesmas coisas. Aí, um belo dia, eu resolvo pesquisar outra coisa. Pronto, meu vício mudou. Ou eu simplesmente enjoei. Ou resolvi ressuscitar antigos vícios. A coisa só não é séria de verdade porque eu ainda não tive condições financeiras suficientes pra alimentar meus vícios como eu gostaria. Ou alguém duvida que, assim que eu puder, vou ter várias coleções de bonequinhos, aparadores de livro, pendrive (eu vi um do Yoda genial!) e o que mais eu puder de Senhor dos Anéis, Star Wars, Cavaleiros do Zodíaco (cá entre nós, a Saori é um porre) ou Superman? Hello Kitty é o cacete, eu sou uma elfa Jedi, rapá. Direto da Terra-Média para Coruscant (passando por Krypton).

Pois é, meus vícios são tão estranhos (pra uma balzaquiana, pelo menos) quanto a forma como eles surgem. Quando lançaram o primeiro filme do Senhor dos Anéis eu não sosseguei enquanto não li a trilogia (e O Hobbit, e ainda preciso terminar o Silmarillion). Entrei numas três listas de discussão sobre o assunto (“os balrogs de Tolkien tinham ou não asas?” parecia ser o novo grande questionamento filosófico, em substituição ao “de onde vim, para onde vou?”), me cadastrei em sites como Valinor e Ardalambion, baixei os trailers dos filmes, todas as fontes de Quenya e Sindarin que encontrei (as Tengwar), baixei a versão estendida dos três filmes (com internet discada!!!!), comecei a estudar o Alto-élfico e me “apaixonei” (dentro dos limites de uma neo-adulta, claro – na época eu tinha uns 20 e pouquinho) pelo Legolas do filme – não o Orlando Bloom, dane-se o Orlando Bloom, eu queria o Legolas mesmo, o personagem. Não, eu não tinha muito o que fazer na época, como vocês devem perceber. Não é um vício lá muito útil, mas posso discutir os hábitos dos elfos com qualquer um.

De arrasto com o vício Tolkien / Terra-média, veio o vício RPG. Não que eu já não tivesse travado um certo contato com os mundos fantásticos antes (tenho cartas de Magic guardadas desde a adolescência – nenhum deck completo, infelizmente), mas o D&D, Tormenta, Gurps e demais mundos de fantasia medieval abriram esse panorama consideravelmente. Confesso que ainda não joguei RPG de mesa (falha que estou tentando corrigir), mas já joguei bastante online, tenho uma pasta no HD repleta de imagens de personagens – eu construo os personagens a partir das imagens deles –, todos os livros de D&D baixados e uma história meio escrita de quase duzentas páginas com elfos, humanos, halflings, etc. Bom, nessa época eu já tinha bem mais o que fazer, mas né? Vício é vício.

Isso sem contar meus vícios em Superman (“Lois & Clark – As Novas Aventuras do Superman” em particular), Star Wars, Garfield, e por aí vai. Alguns desses vícios são úteis; por exemplo, no auge da segunda (e mais recente) fase do vício L&C eu comecei a aprender inglês na cabeçada, porque todos os sites com bons conteúdos a respeito da série são em inglês. Além disso, de tanto assistir aos episódios de L&C minha compreensão do idioma aumentou consideravelmente (eu sei várias falas de cabeça, realizem). Alguns eu até assisto com legendas em inglês, porque eu já sei as falas em português mesmo... E é pra falar em outro vício com algo de útil que eu comecei a escrever isso aqui. Quero falar sobre um musical e um livro.

Minha paixão absoluta da temporada, há pelo menos um ano, tem sido Luis XIV. É claro que eu já ouvira falar dele antes disso, afinal, eu sou formada em dança, tive aula de História da Dança e, ora bolas, estou me especializando nisso. Então é claro que eu conhecia algo sobre o Rei Sol e sua contribuição essencial para a profissionalização da dança. Mas a questão não é essa. Aliás, se dependesse da disciplina que eu tive na faculdade, com o professor que eu tive, eu tinha tudo pra ODIAR Luis XIV e o período conhecido como ballet de cour (balé da corte). Enfim, mas deixando os “traumas” pra lá, tudo começou quando uma amiga precisava fazer prova de canto no curso de teatro, e começou a procurar uma música em outro idioma. Ela recém tinha voltado de um intercâmbio na França, e resolveu escolher uma música de um musical de lá. A música era Mon Essentiel, e o musical, Le Roi Soleil. Pronto. As pessoas que me cercam não sabiam, mas iam começar a me aturar enchendo o saco à francesa (aliás, acho que essa minha amiga se arrepende até hoje por ter me apresentado a música). Esse é outro bom exemplo de vício útil que toma minha vida; aprendi muito mais francês revendo o musical, decorando as músicas e lendo sobre Luis XIV do que em seis meses de curso. Pra quem se interessar em baixar o musical, tenho as legendas – cheias de erros que estou corrigindo, diga-se de passagem (porque sou abusada, ho-ho-ho. O que eu disse sobre o vício útil? Já me meto a besta de corrigir legendas com o francês como idioma falado).

La troupe de la comédie musical
(Lysa Ansaldi comme Athénaïs de Montespan ; Christophe Maé comme Phillipe, Le Monsieur, frére du Roi ; Anne Laure Girbal comme Marie Mancini ; Emmanuel Moire comme Le Roi Soleil ; Cathialine Andria comme Françoise de Maintenon ; Merwan Rim comme Duc Beaufort e Victoria Petrosillo comme Isabelle, la fille du peuple).

Emmanuel Moire, Le Roi Louis XIV.
Querido Papai do Céu, será que rola um clone (hetero) dessa criatura aí de cima pra mim? Juro que não O perturbo mais pelo resto da minha vidinha... Que, com um homem desse, pode até ser curta que eu nem ligo...


É claro que o musical, embora inspirado em fatos históricos, tem muito de fantasia. Ele é basicamente calcado sobre três dos principais amores do Rei Sol: Maria Mancini, Athénaïs de Montespan e Françoise de Maintenon, e o apresenta como um homem romântico e apaixonado – coisa que não era exatamente do feitio do notoriamente controlado (e controlador) Luis histórico. Embora ele fosse sim dado a paixões avassaladoras, com uma libido incansável pra lá de famosa (Luis foi pródigo em bastardos), não se pode descrevê-lo exatamente como um romântico. Maria Mancini que o diga. Mas enfim, falemos do musical.

(Para uma descrição detalhada do musical, inclusive com explicações históricas pra certas menções feitas no roteiro que, de outra forma, passariam despercebidas, clique AQUI. O texto ficou gigantesco e nem todo mundo tem a fixação histórica nas coisas que eu tenho – e menos gente ainda, suponho, tem a minha fixação por Luizinho)

De uma maneira geral, o espetáculo é excelente. Os cenários são esplendorosos, o figurino extremamente apurado, nos mínimos detalhes, e a atuação dos atores / cantores não deixa nada a desejar. Emmanuel Moire consegue dar o tom certo de galanteria necessário ao personagem; embora sua beleza tenha sido muito citada à época, para os padrões modernos Luis XIV não era exatamente um homem bonito (ao contrário de seu intérprete, diga-se). Na verdade acredito que ele tenha sido o tipo de homem cujo charme e presença eram tão marcantes que o cercavam de uma aura de beleza que transcendia o físico. Quem é mulher sabe do que eu estou falando.


Luis, por volta dos 20 anos, segundo os escritores da época, “no auge de sua beleza”.

Mas, independente de beleza, se havia algo na corte da França do século XVII que poderia superar qualquer ausência de atrativos físicos era a galanteria – e definitivamente Luis soube ser galante, uma qualidade que Manu conseguiu aplicar muitíssimo bem ao personagem. As representações dos outros também foram muito boas, mas eu faria uma ressalva; acho que faltou um pouco de sensualidade à Montespan. Um dos apelidos dados a ela entre os boêmios era “a Torrente”; ela era uma explosão de sensualidade, algo assim tipo uma Angelina Jolie do século XVII. Enfim, fala-se tanto dos musicais da Broadway, mas definitivamente os musicais franceses (ou francófonos de um modo geral, já que outro musical maravilhoso, Notre Dame de Paris, salvo engano, é canadense) não deixam nada a desejar. É um espetáculo que vale a pena ver – mesmo que seja em vídeo.

Mas ainda falando de Luis XIV, um livro interessantíssimo que recomendo a quem gostaria de saber mais sobre ele é “O Amor e Luis XIV – As Mulheres na Vida do Rei Sol”, de Antonia Fraser, de onde tirei a maioria das informações históricas que usei na descrição detalhada sobre o musical. A autora faz um levantamento minucioso da corte francesa desde antes do nascimento de Luis até os últimos dias do soberano, e não trata apenas de suas amantes, mas de todas as mulheres que foram importantes para o rei, como sua mãe e principal conselheira durante anos, suas filhas, suas cunhadas e a esposa de seu neto, uma criança que foi muito amada por ele. É uma narrativa detalhada e leve, fácil de ler e difícil de parar. Mais do que o Rei Luis, temos um retrato de como era o Homem Luis. Recomendo vivamente.

Por fim, pra terminar este post enorme sobre meus vícios e, em especial, sobre meu vício atual, apelo a Liselotte, segunda cunhada de Luis XIV, e deixo que ela fale sobre o que me fascina na vida do Rei Sol e sua época:

“Acredito que as histórias que serão escritas sobre esta corte depois que todos desaparecermos serão melhores e mais interessantes que qualquer romance... e temo que as gerações futuras não sejam capazes de acreditar nelas e pensem que não passam de contos de fadas.”

* O título deste post é o nome de uma das músicas do Le Roi Soleil.